Aprender ontem e hoje: o que muda?

Até os meus 10 anos de idade, trinta anos atrás, na minha casa havia apenas a Bíblia de papai, coberta com um pano em cima da estante da sala e alguns livretos de cordel amarelados, guardados na gaveta da prateleira do corredor, que liga a sala e a cozinha. Hoje, diz Castells, 97% da produção do conhecimento humano está digitalizado, quase toda ela disponível no meu smartphone, ou seja, na palma da minha mão.

O que isso significa no processo de aprendizagem e na formação da identidade cultural de uma pessoa?

Morando no sítio, sem energia elétrica, o único meio de comunicação de massa era um grande rádio de madeira, também muito bem protegido, o objeto mais precioso da casa, que apenas papai ligava em momentos determinados: cantoria, missa e outros programas de seu interesse. 


Dentro da cartolina da escola, o caderno e a cartilha do abc. Anos mais tarde, recebo um livro emprestado da escola, maior e mais bonito, com fotos em preto e branco. Não era meu, não podia escrever meu nome, muito menos rabiscá-lo, era algo quase sagrado. Eu, como outros colegas, cobria a capa e a contracapa com papel de presente. No final do ano, a gente o devolvia para a professora. 

Vou crescendo e, ano após ano, vou tendo acesso a mais livros. Porém, somente no penúltimo ano do ensino médio, entro, pela primeira vez, em uma biblioteca. 

Na reta final dos estudos de seminário, filosofia e teologia, no final do milênio, começo a fazer acanhadas pesquisas nos sites de busca da internet. Todavia, o meu analfabetismo digital e a limitação da web 1.0 da época contribuíram muito pouco no processo da minha aprendizagem. Aqui, vale lembrar que, no final do milênio apenas 1% da população mundial tinha acesso a internet, hoje, mais de 50% está conectada.

O tempo passa e, à medida que a internet vai se aperfeiçoando, vou me encantando com a infinidade de literatura, informação, jogos, relacionamentos, diversões, etc. que a rede me proporcionava. Foi ela que, anos depois, influenciou-me a estudar comunicação. 

Nas teses de conclusão do bacharelado e mestrado, a partir de 2008, estudei dois fenômenos que eclodiam na época: o citizen journalism web (jornalismo cidadão) e o uso do Twitter no prosumer informação. 

Após alguns anos, buscando aprender e a usufruir da melhor forma possível do mundo “anárquico” e interativo nas mídias digitais, decido retomar os estudos com a mente focada não apenas nas plataformas digitais (Twitter, Facebook), mas na atmosfera digital, na nova cultura que emerge dos novos modelos de comunicação pessoal e coletiva nas mídias digitais. 

E aqui estou! Nos últimos minutos de 2017, entrando por inteiro, corpo e alma, no campo de pesquisa que me fará perceber a maior revolução paradigmática, civilizacional que a sociedade viverá nas próximas décadas. Como diz Castells (2005, p. 414), Tapscott e outros estudiosos, a revolução que o digital está provocando é semelhante à revolução causada com a chegada do alfabeto na Grécia, séculos antes da era cristã. 

Diante de uma mudança paradigmática que “já e ainda não” penetrou de forma disruptiva no “DNA” das instituições (escola, política, economia, religião), o passo urgente que deveríamos dar seria o de nos preparar/capacitar para entrarmos com menos insegurança nas novas formas de “ser”, de pensar, de estudar, de comunicar, de relacionar, de fazer quase tudo. 

Como futuro “professor” da FDM, quero me preparar, exclusivamente, para o mundo da docência. Coloco “professor” entre aspas porque também o seu papel será outro. Não mais o de ensinar, de transmitir conhecimento, mas o de articulador, mediador, que sugere vias mais seguras, objetivas e confiáveis para o aprendiz. 

O papel de professor, aquele de ensinar algo, fazia pleno sentido nos meus 10 anos de idade, quando todo o conhecimento estava guardado na gaveta do professor. É a badalada “educação bancária” que Paulo Freire falava no século passado. Hoje, quase todas as fontes que uso para as minhas pesquisas - livros, enciclopédias, dicionários, revistas, artigos científicos, vídeos - estão disponíveis no meu smartphone, a um clique de distância. 

Por isso, na cultura digital emergente, uma das responsabilidades do “professor”, com toda a sua bagagem intelectual, e, sobretudo, com a sua experiência na ambiência digital, é o de motivar o aluno a seguir, da melhor forma possível, os passos conceituais e metodológicos na direção da realização do objetivo do seu estudo, da sua pesquisa.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

CONVITE - Festa de Nossa Senhora de Fátima 2014

Por que um meio de comunicação quente é frio? McLuhan explica.

Reflexão da noite de Natal - Deus com saudade da gente