Palestra na UnP: Mídias sociais na Sociedade-rede



Para preparar a palestra, andei nos ombros de alguns pensadores da sociedade-rede emergente. Alguns deles estão na bibliografia da minha tese de mestrado, que defendi recentemente em Roma, com o tema: “A Informação digital através das redes sociais”. 

Na conversa abaixo, dei preferência ao espanhol Manuel Castells, que o considero o melhor sociólogo da emergente sociedade-rede. Depois, o francês Pierre Levy, provocador filosófico da Cybercultura, da “inteligência coletiva”. Em seguida, o americano Clay Shirk, professor na New York University, defensor da rede como espaço gerador de capital social, de democracia participativa, etc. Aqui no Brasil, também temos alguns pensadores 2.0. Entre outros, destaco o guru das redes sociais,  Augusto de Franco e o carioca pensador 2.0, Carlos Nepomuceno.

Nossa conversa está dividida em 4 partes: 
  • Na primeira, faremos uma rápida viagem no contexto atual da cultura 2.0, das mídias sociais; 
  • Na segunda parte, faremos uma comparação das mídias sociais hoje com a invenção do livro impresso. O que há em comum? 
  • Na terceira parte, observaremos alguns fenômenos sociais que emergem com as mídias sociais; e 
  • Concluiremos com algumas provocações que os pensadores 2.0 fazem para quem quer viver e trabalhar com êxito nas mídias sociais.
I PARTE
Estamos entrando no século XXI com uma nova geração vivendo nas mídias sociais. Estamos conectados o tempo todo. Isso nos deixa, ao mesmo tempo, extasiados e angustiados. A maneira de nos relacionar, de trabalhar, comprar, vender, estudar, fazer amigos mudou e muda constantemente em um ritmo acelerado.

A cultura 2.0 é a plataforma de onde emerge uma nova civilização, que é a provocadora de uma sociedade fundada na colaboração, no diálogo e no surgimento de uma comunicação horizontal e interativa.
 
O tradicional modelo de comunicação é o monologal, unidirecional;
O novo modelo de comunicação que emerge com a rede é o da conversação, bidirecional.

Predomina entre as tradicionais instituições: escola, política, família, Igreja o modelo comunicativo, centralizado e unidirecional. Essas instituições estão tentando entender o que rola dentro das cabeças dos nativos digitais, dos que vivem a cultura 2.0.

Daí surge o choque de mentalidade, choque de paradigmas entre pais e filhos, professor e aluno, entre consumidor e mercado. "Os consumidores de amanhã serão os nativos digitais de hoje" e eles têm sempre alguma coisa pra falar sobre nosso produto, não são consumidores passivos.

Nos últimos anos, esse novo continente das mídias sociais está se tornando a atividade online mais popular do mundo. As redes sociais estão se tornando o meio natural da nossa cultura, fazem parte da nossa vida, é algo muito mais profundo que um simples Facebook ou Twitter.

A infiltração da cultura digital é viral, muito veloz. De 2000 para 2012 houve um crescimento de mais de 500%, passando de 300 milhões para mais de 2 bilhões de pessoas conectadas.

As mídias sociais lideram. Twitter mais de 500 milhões; Facebook já passa de um bilhão de pessoas. Nunca, na história da humanidade existiu uma tecnologia com um poder de infiltração tão rápida como a da Internet.

No Brasil, 82 milhões estão na rede, ou seja, mais de 43% da população do país.

Um efeito assustador dessa revolução é a mobilidade, e, consequentemente, a redução do espaço físico das tecnologias. Do mainframe, para computadores, depois para laptop e agora, para a palma da nossa mão.

São mais de 5 bilhões de celulares no mundo; destes, mais de bilhão conectados na internet. Esta é a grande mudança na nova cultura da comunicação: a rede móvel, rápida e barata.

Desse modo, o celular passa a ser uma ferramenta fabulosa na divulgação das manifestações cívicas, da democracia participativa, da comunicação e informação em geral. Nas manifestações, o povo não levanta mais os punhos, nem armas, mas, seus celulares conectados em rede. Antes, precisavam de meios potentes para fazer ecoar no mundo a indignação do povo, hoje, o eco vem de baixo, das mídias sociais.

O poder no século XXI vai tendo, pouco a pouco, uma identidade nova; é o poder das redes, da inteligência das multidões, de um "hashtag". A democracia das praças tem fortes influências nas redes, ou para muitos, nascem nelas, de uma twitada, um vídeo no YouTube, uma foto no Facebook.

Nasce com a rede uma "cidadania conectada". Quem tem uma causa para estar em rede, tem a possibilidade de interagir e fazer valer sua causa porque são as causas que movem o cyberativismo, o capital social: a política, os direitos humanos, em síntese, o desejo de mudança.

Para o físico americano Cris Anderson, estamos em uma nova civilização, mudamos a maneira como aprendemos, trabalhamos, politicamos.

Segundo Castells, a mudança maior nesses últimos tempos é a passagem da comunicação de massa para a auto-comunicação de massa, interativa, que chega através de pessoas, organizações, etc. que não se sentem representadas pelo poder.
II PARTE

Pierry Levy diz que não podemos compreender  o rebuliço que a Internet está provocando na gente, sem entender a história. É preciso afastar a cara da parede e buscar ver a partir de um ângulo mais aberto.
Muitos comparam a chegada da Internet com a chegada do livro em 1500.
“Para o cidadão que saia da Idade Media, o livro era uma espécie de Facebook”. Por quê? Por que o livro passou a ser uma mídia barata e, depois, tinha pouca relação com a estrutura de poder.

A partir de então, mentes revolucionárias mexeram na estrutura política e religiosa da época: enfrentaram reis e soberanos. A Igreja e os reis não tinham noção do efeito e do poder da nova mídia, o nascimento do livro impresso. Por exemplo, as 95 teses da reforma luterana se proliferaram como relâmpago em toda a Europa, graças à velocidade do papel impresso.

Com a popularização do livro impresso expandiu-se as ideias, houve uma oxigenação cultural, nasce uma nova era de pensadores e de revoluções: revolução americana, revolução francesa, revolução industrial, etc. 

"Caíram os tronos dos reis e se esfacelaram coroas milenárias", surge uma nova democracia, uma nova sociedade. 

III PARTE
Porém, como entender essa sociedade-rede que emerge com a Internet? Quais são as teorias que a sustentam? Como se explica esse avalanche de gente conversando nas redes?

Na minha tese de mestrado, recorri às três topologias de redes desenvolvidas por Paul Baran, um polaco engenheiro naturalizado nos Estados Unidos.


Somente para se ter uma ideia, essas topologias de rede serviram de inspiração para o nascimento da Arpanet, hoje, a conhecemos por Internet. Compreender, portanto, a dinâmica desses três gráficos é fundamental para entender os fenômenos que ocorrem na sociedade-rede emergente.

Ao observar cada uma delas, pergunta-se: “Essas três redes coexistem e as mesmas pessoas podem se organizar dessas três formas?” Exato.
Observe que nos três tipos de redes os nós estão no mesmo lugar, ou seja, são as mesmas pessoas. Assim sendo, “é a dinâmica das conexões entre os nós que determina se a organização é centralizada, descentralizada ou distribuída.”

Na rede centralizada, tudo passa pelo nó central para depois ser distribuído para outros nós. O poder de controle é concentrado em uma única pessoa.

Na rede descentralizada, o funcionamento dá-se por meio de várias redes centralizadas e conectadas entre si. Esse modelo é o que predomina em quase todas as organizações que conhecemos (governo, igrejas, escolas, empresas, etc.).

Enfim, na rede distribuída, não há centro, qualquer nó pode dar e receber conteúdo de qualquer outro nó, através da livre interação.
Havendo em mente esses três tipos de rede, é possível entender melhor os fenômenos que emergem com as novas ciências das redes. 

Augusto de Franco explica alguns fenômenos que estão eclodindo nos últimos anos. Abaixo, vemos 3 fenômenos:

Clustering(aglomeramento); "Tudo o que interage, aglomera, clusteriza".  Pequenos grupos que se reúnem em tordo de causas comuns.

Swarming (enxameamento); imagens da "primavera árabe"; a multidão na praça Tahrir gritando o fim do regime ditatorial de Mubarack; o movimento dos indignados na Espanha; o "Occupy Wall Street".

Crunching (amassamento); o mundo fica cada vez menor, não em nível geográfico, populacional, mas em nível de relação. Quanto mais conexão, menor o mundo fica.
Quanto mais distribuída, menor é o mundo, mais forte vai ficando a sociedade. Isso explica bem os fenômenos que estão acontecendo no mundo. 

Nessa ótica, a internet se apresenta como uma das maiores revoluções da comunicação e informação da história.

Muito diferente foram as mídias de massa: a tv, rádio não fazem nenhuma alteração na estrutura de poder. Ao contrário, elas reforçam o poder. Os regimes totalitários foram os primeiros beneficiários.

Embora a Internet, na sua origem, tenha sido usado para fins militares, ela sempre teve uma identidade revolucionária e anárquica. Pensando desse modo, a gente evita cair num tremendo conservadorismo, ou seja, deixamos de usar a Internet como fazemos com o uso do rádio e a tv, passivamente, e a usamos como uma mídia que abre caminhos às mudanças.

Na sociedade rede - "cada pessoa conectada é uma grande ONG". Daqui nasce o novo poder, o poder das multidões.

A cultura 2.0 não é um discurso meramente tecnológico, mas de mudança de paradigma. Posso ter conta no Twitter, Facebook ou em qualquer outro site, mas se não tenho a disposição interior de participar, de compartilhar conteúdos, valores, nada vai acontecer. "A  cultura 2.0 constrói cada um, a partir da sua interação, colaboração, energia e atitude".

IV PARTE
Fotografar o processo de desenvolvimento das mídias sociais é quase impossível porque o filme está no início, estamos ainda na pré-história da internet. Não dá pra fazer um diagnóstico preciso do que está acontecendo nesse mundo das mídias sociais, da cultura digital. Mais difícil ainda é prever como será o futuro das novas mídias.

Resumindo, certos pensadores 2.0 deixam alguns recados provocadores para quem deseja viver e trabalhar nas mídias sociais, sobretudo, os que pensam inovar seus negócios:

“Não adianta mudar o software, tem que mudar o hardware!”. Interpreta Augusto de Franco: “Não há software inovador que possa rodar num hardware conservador”.

Para inovar numa empresa é preciso conversar, aumentar o grau de interação e isso acontece quando a rede deixa de ser menos centralizada e passa a ser mais distribuída. “Se a topologia da rede social de uma empresa ou de qualquer instituição for mais centralizada do que distribuída, a empresa será mais conservadora do que inovadora”.

Diante dessa atmosfera digital, o primeiro passo que uma empresa ou instituição devem dar é: aprender a escutar; segundo, entrar, humildemente,  nas redes pra conviver e interagir com os que estão falando sobre nossa marca, nossa instituição e, terceiro, produzir por meio de redes.
Não basta apenas usar de forma instrumental os sites de redes sociais, é preciso conviver dentro desse novo ambiente cultural.

Enfim, estamos nos primeiros minutos desse mundo da conversação, da inteligência das multidões, do crowdsourcing, crowdfunding, que emergem nas redes. Quanto mais abrir-se à essa cultura 2.0, melhor viveremos porque já tá escrito: o velho mundo não volta mais e o mundo das mídias digitais não é uma moda passageira. 

Por isso, quanto mais rápido adaptarmos à sociedade-rede emergente, melhor é. 

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