Edilson: um irmão sonhador


Raízes

Seus pais são Abraão Chaves e Nucy Dantas. Ele é o sétimo de uma família de nove filhos. Os três primeiros são Gilvany, Talvacy e Evanda. Em seguida nasceram mais três filhos, destes, José e Maria morreram no primeiro dia de vida e Rosilene faleceu depois de sete meses de nascida. E por último, veio a terceira geração composta por Edilson, Evanúzia e José.

Edilson nasceu no dia 03 de julho de 1982 na maternidade Dom Eliseu em São Miguel-RN. Seu estado de saúde, nos primeiros meses, era muito isntável. Era um bebê desnutrido e vivia a maior parte do tempo doente. Sua mãe o levava com frequência às rezaderas, gesto este, utilizado frequentemente com muita devoção, por todas as famílias da região. Conta sua mãe que, ele conseguiu se recuperar da frágil saúde graças as orações das rezadeiras, a proteção de São Francisco de Assis e aos tantos remédios alternativos que ele tomou.

Seus padrinhos de batismo são Tia Antônia e Tio Zerinho e a madrinha de apresentação é a sua prima Ir. Maria Lima. Sua catequista de preparação para a Eucaristia foi Neci de Lourdes. Todos os domingos ele, junto com sua irmã Evanúzia participavam do catecismo e no ano de 1994 com doze anos de idade fez a primeira comunhão na capela de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro em Venha Ver.

Fiel e companheiro

Os pais são a âncora para a formação e o futuro dos filhos. Edilson, desde criança, encontrou no exemplo dos pais, a filosofia para a sua vida. Vendo a dura vida do agricultor, não hesitou em estar ao lado do pai e colaborar com o mesmo em todos os trabalhos do campo. Plantar, limpar mato, brocar, arrancar toco, catar feijão, cuidar do gado, etc. Eram trabalhos ordinários que ele fazia cuidadosamente.

Recordo muitas vezes que, quando eu estava em férias do seminário contemplava aquele jovem que chegava cansado da roça, com os trages do trabalho: botas nos pés, uma calça surrada, uma camisa velha de mangas longas para se proteger do sol e um chapéu na cabeça. Ele revelava para nós irmãos, o prazer de trabalhar e de ajudar ao pai. Algumas vezes, eu levava o almoço para a roça no período de minhas férias e pude de fato, ver aquele jovem, brocando, limpando mato, ... Enquanto almoçavam em cima de um murro ou debaixo de uma árvore, ele conversava sobre seus estudos, seus sonhos, suas vacas, seus negócios, etc. Contudo, atrás daquele rosto estafado do trabalho, refletia um sorriso de esperança, de amor pelo que fazia e, acima de tudo, um olhar que apuntava para um futuro promissor.

No período das moagens, meu Deus, ele era um “fera”. Topava tudo. De longe se avistava aquele menino fazendo o trabalho de homem grande: despelar cana, tirar o bagaço muído, carregar cana do baxio... o trabalho que fosse preciso fazer, ele encarava com coragem e responsabilidade.

Escola

Sua primeira professora foi Emídia de Zé Leite com quem aprendeu o alfabeto e a formar as primeiras palavras entre os anos de 1989 a 1991. A segunda foi Maria de Zé Monteiro com quem estudou a segunda e a terceira série nos anos sucessivos, 1992 e 1993.

Em 1995 estudou a quarta série na escola Maria Tertulina de Freitas em vila Caldeirão. Entre os anos de 96 a 98 estudou e concluiu o período colegial na Escola Pedro Trajano Tores na cidade do Venha Ver. Sua companhia de escola eram Evanúzia e José. Os estudos, nesse período, foram feitos sempre na parte da tarde porque pela manhã trabalhava com o pai na roça. O pai fazia de tudo para que os filhos não perdessem um dia de aula. Independente do acúmulo de trabalho: muito mato para limpar, muito feijão para catar, etc. quando chegava o horário da escola, o pai ficava sozinho, enquanto ele e José, seu irmão mais novo, saiam correndo para chegar em casa, tomar banho, almoçar e depois andar mais seis quilômetros para poder chegar em tempo à Escola.

Aqui recordo uma cena inesquecível que registrei em fotografia com Ele e José. A foto foi tirada na calçada da caça dos pais, quando estavam de saída para a escola. Cada um com uma pasta na mão(conhecida na época por cartolina) e um chapéu na cabeça. O pai havia comprado naquela época, chapéus e pastas idênticos para os dois.

O Ensino Médio foi feito entre 1999 e 2001 na cidade de São Miguel nas Escolas Elisiário Dias e Gilney de Souza. O ritmo nesse período também não foi muito fácil. O estudo era à noite. Todo dia andava até a beira da estrada para esperar o duro caminhão “pau-de-arara” e enfrentar 18 km em estrada de barro cheia de ladeiras e buracos. No período do inverno, quando chovia muito ou quando o caminhão se atolava, era preciso, muitas vezes, voltar a pé para casa à noite, debaixo de chuva.

Mesmo com todas as dificuldades de um estudante que morava no sítio, o seu nome em sala de aula era honrado e reconhecido como um aluno aplicado e inteligente. Uma de suas professoras, certo dia falou-me que tinha medo das perguntas que Edilson fazia, isto porque o conteúdo que o professor explicava para os alunos, na maioria das vezes, ele já havia estudado. Por trabalhar durante o dia, seu pai o ocordava de madrugada, e assim, com a luz da lamparina, podia se preparar para as provas e as atividades de classe.

Empreendedor e amigo

Edilson sempre foi uma pessoa determinada e decidida. Sonhava longe, porém sempre de forma muito consciente e com os pés no chão. Ainda adolescente, aprendeu a investir em negócios da agricultura e pecuária. Seu pai o incentivava dando-o um pedaço da roça. Assim, cuidava-a, colhia o legume e vendia para investir em gado e ovelhas. Passo a passo aumentava o seu negócio. Começou a comprar bezerro, garrote magro na vizinhança para poder engordar, vender e colocar o dinheiro no banco. Sou seguro que, já nesse período, ele tinha plena convicção do que pensava fazer no futuro.

Penso que algumas pessoas, além dos pais, influenciaram fortemente no seu projeto de vida. Ricordo aqui a sua amizade com Raimundinho, um jovem do sitio vizinho. Este amigo era um jovem envolvido nos trabalhos da Igreja, nas organizações sindicais e era muito respeitado pela pessoas. Eles se encontravam com freguencia, participavam do grupo de jovens do Venha Ver e aí viveram momentos importantes de oração, amizade e reflexão sobre a vida e os desafios no mundo jovem. Eles, juntos com Ledjane que era, na época, uma forte animadora da comunidade, lideraram a animação do grupo de jovens, fizeram algumas romarias com para o Santuário do Lima e tantos outros serviços em prol da comunidade.

Em meio a essa realidade de Igreja, Edilson tornou-se próximo do padre Zezinho, com quem pode conversar muitas vezes e pedir conselhos sobre a sua vida. Em uma dessas conversas, o padre deu-lhe uma medalha do Papa João Paulo II e uma santinha, que, segundo sua irmã Evanúzia, ele ainda preserva em sua carteira até hoje.

“Quero cursar Direito”

Foi quando estava estudando no Venha Ver, na sexta séria que, pela primeira vez, expressou de forma segura o desejo de estudar Direito. Com essa certeza, quis apressar o ritmo de estudo e logo optou por fazer no ano seguinte o supletivo (sétima e oitava). A partir daí, consciente do desafio que o esperava, passou a estudar com mais determinação e ousadia.

Contudo, segundo sua irmã Evanúzia, há um outro motivo que o instigou a ir em frente. Certo dia, quando estudava em São Miguel, uma professoura perguntou aos alunos que curso pensam fazer quando concluir o ensino Medio. Quando chegou a sua vez, respondeu-lhe que iria fazer Direito. A professora ironicamente disse: “É bom pensar no curso de Direito pra ver se pelo menos consegue fazer letras”. Isso mexeu profundamente com a sua capacidade intelectual, crescendo assim, o interesse mais ainda pelos estudos e, no futuro, mostrar que consegueria muito mais do que um simples curso de letras.

Neste mesmo ano passou no concurso do IBGE para trabalhar no senso de 2000. Neste trabalho do levantamento dos dados da população de São Miguel, pode conhecer alguns jovens que na época estudavam em Natal. Assim, ele já começou a se informar e a perguntar que passos precisava fazer para estudar em Natal. O interessante é que, ele sozinho, tomava iniciativas e, sem precisar que seu pai se preocupasse, conseguia resolver tudo aquilo que planejava.

Cursinho em Natal

Ao concluir o Ensino Médio era consciente que os estudos ainda eram insuficientes para passar no vestibular de Direito. Daí, a necessidade de sair de casa pela primeira vez e ir com destino à Capital. O resultado do seu trabalho no campo e na pecuária o deixou numa situação bastante autônoma. Era consciente que seu pai perdia um grande amigo e companheiro da roça, mas, ao mesmo tempo, sentia-se aliviado e de consciência tranquila porque sabia que o pai não precisaria pagar os estudos do filho. O dinheiro do legume vendido e dos inteligentes negócios na pecuária, era suficiente para pagar suas futuras despesas.

Chegando na Capital procurou estudar nos melhores cursinhos. Sem cerimônia de identificar-se como filho de agricultor, usando uma boa lábia, sempre conseguia obter bons descontos nos cursos que fazia. Na casa dos estudantes, depois de poucos dias, ficou reconhecido como o “cara” que estudava muito. Todos o respeitavam e admiravam o seu modo responsável e solidário para com aqueles que pediam ajuda. Nunca criou conflitos. Tive a oportunidade de visitá-lo algumas vezes e pude testemunhar o quanto de fato, os colegas falavam a respeito da sua moral e do ritmo incansável nos estudos.

Ricordo que, em uma das visitas os colegas brincavam dizendo: “seu irmão é louco, estuda demais. Ele come o miojo com caminho do supermercado pra não perder tempo conzinhando. E mais ainda, quando ele vai fazer o café, coloca o pó e o açucar na boca, depois mistura com água e bebe.” Não sei se isso procedeu alguma vez, mas os seus colegas se divertiam contando essas estórias.

O Resultado

No final do ano de 2002, prestou vestibular na UFRN e UFCG. A expectativa da família era grande, apesar de saber, que seria quase impossível, que um jovem do sítio passasse no vestibular logo no primeiro ano de cursinho.

O primeiro resultado foi da UFRN. Não passou. Sem perder a esperança, voltou para Natal, ainda em Dezembro a fim de continuar os estudos. Poucos dias depois, saiu o resultado da UFCG. Sinal verde, a alegria invadiu o seu coração e sozinho em Natal comemorou a vitória. Querendo fazer uma grande surpressa para a família, não comunicou o resultado. No dia seguinte chega em casa, sem avisar a ninguém, com a cabeça raspada. E aí, ninguém suportou a tamanha emoção. Mãe, pai e os irmãos explodiram de orgulho e alegria.

Universidade

No segundo semestre de 2003 começou os estudos de Direito em Souza, PB, e passou a morar na residência universitária, localizada nos fundos da faculdade. Sentindo a necessidade de investir em compras de livros para obter bons resultados nos estudos, viu-se obrigado a trabalhar. Assim o fez. No ano seguinte, 2004, fez concurso para Investigador da Polícia Civil, passou e, depois dos exames exigidos pela corporação, começou a trabalhar nos finais de semana na delegacia de Pombal. Com o trabalho conseguia comprar os livros, ajudar os irmãos e muito mais.

“Concretizando isso, me sinto realizado.”

No fundo, o desejo de conciliar estudo e trabalho era por uma razão muito maior: poder ajudar aos pais. Mais do que todos os irmãos, ele testemunhou na pele o sofrimento do homem do campo e, por isso, é sabedor que o dinheiro que sai da agricultura é insuficiente. Um dos seus grandes sonhos é poder oferecer aos pais uma vida confortável e digna. Certo dia, fiquei profundamente emocionado ao ler uma declaração que ele fez com relação aos seus pais. Escreveu ele: “hoje tenho um grande objetivo na minha vida: fazer meu pai e minha mãe as pessoas mais felizes possíveis. Concretizando isso, me sinto realizado.”

José e Evanúzia

Para cada geração, houve um coordenador que inspirou os demais. Gilvany para os da primeira e Edilson para os da terceira geração. Edilson foi quem abriu as portas para Evanúzia e José e os encentivou a encarar os desafios com raça e determinação. Cuidou

primeiro da irmã, levou-a para Natal, escolheu um excelente cursinho e por fim disse: “Vanuza, o resultado agora depende do seu esforço”.

Conta Evanúzia que, ao ver a preocupação e o esforço do irmão em querer ajudá-la, sentiu-se que agora, havia uma maior responsabilidade e uma obrigação de mostrar resultado. Segunda Evanúzia, ele era o porta voz do pai e, portanto, desobedecer a ele, era o mesmo que desebodecer ao pai. Ao perguntar quem é Edilson, ela respondeu: “Edilson para mim é o paizão, o cara incentivador, é a inspiração para estudar, é o exemplo de coragem, é determinado, inteligente e prestativo”, e para concluir ela disse: “ele é também moralista demais e machista”.

Não foi diferente com José. Aquilo que fez com a irmã, repetiu o mesmo com o irmão. Em natal, ao chegar na casa dos estudantes foi logo identificado como “o irmão do Edilson”. Para José, ser reconhecido assim, era antes de tudo, um peso moral e uma responsabilidade grande.

O estudo como paixão

Além de trabalhar e estudar, viu que ainda havia tempo para fazer outro curso. No ano de 2005 fez vestibular para Contábeis na mesma universidade, passou sem dificuldade. Programou-se e assim estudava na parta da manhã o curso de Direito e no período da noite cursava Contábeis.

Fez sua formatura de Direito em 2007. Seus pais, irmãos e amigos estiveram na ocasião e testemunharam com alegria esse inesquecível momento. O estudo continua. Logo em seguida começou a especialização em Processo Civil. Fez outros concursos ao longo desses anos e por último neste ano de 2009 passou em três deles: Tribunal de Contas para o Piauí, Delegado Civil da Paraíba e Delegado Civil do Rio Grande do Norte. Como é impossível ocupar os três trabalhos simultâneos, escolheu ocupar o cargo de Delegado do RN.

Reconhecimento e gratidão

Para concluir, caro mano, após uma breve e simples apresentação de sua vida, quero dizer-lhe que a sua família, sobretudo, seus pais e irmãos, é profundamente honrada pelo seu testemunho, seu heroísmo, seu caráter, e sobretudo, pela sua dimensão humana, sensível e solidária.

E neste dia em que celebra mais um ano de vida, todos nós estaremos redendo Graças a Deus por você ser essa grande luz incandescente em nossas vidas. Nossos sinceros parabéns e que a Sabedoria Divina lhe acompanhe sempre.

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